Textos - 1º experimento


Novidade!!!!

Publicação dos textos dramáticos produzidos de maneira colaborativa entre o público, atores, diretor, técnicos e dramaturgo no projeto O quinto criador: o público!

Por colaborativo compreende-se aqui: "na criação colaborativa o texto não existe a priori, vai sendo construído juntamente com a cena, requerendo com isso a presença de um dramaturgo responsável, numa periodicidade a ser definida pela equipe" (GUINSBURG, FARIA e LIMA, 2006, p. 253).

Referência bibliográfica:

GUINSBURG, J.; FARIA, João.; LIMA, Mariângela A. (Orgs). Dicionário do teatro brasileiro:

 Temas, formas e conceitos. São Paulo: Perspectiva, 2006.

No dia 22.10 os temas propostos pela dramaturga Luciana Comin foram diluídos em um só pelo público a saber:

1 - "Há histórias tão verdadeiras que às vezes parecessem que são inventadas." (Manoel de Barros)
 2 - "CURVA PSICODÉLICA/ a mente salta dos trilhos/ LÓGICA AISTOTÉLICA/não legarei aos meus filhos." (Paulo Leminski)

Diante disso,  foi criada a cena dramatúrgica intitulada:

AMORES VACAS
(PORQUE TUDO ISSO ME LEMBRA ALEJANDRO GONZÁLEZ IÑÁRRITU)

Por Luciana Comin


O público do dia 22.10.2012
Elenco conidado: Lulu Pugliese, Milena Flick, Gabriel Camões, Igor Epifânio, Fabio Ferreira e Bruno de Sousa
Diretora convidado: Jacyan Castilho
Técnicos convidados: Karina Allata (figurino e maquiagem), Fernanda Mascarennhas (iluminação), Adriana Prates (DJ), Alessandra Novhais (fotografia), Fred Alvim (ambientação do espaço), Raquel Maciel e Carlos Alberto Ferreira (produção)
Coordenação artística: Cristiane Barreto
Cabaré dos Novos - Teatro Vila Velha - Salvador. BA

A cena se passa em três planos distintos e intercalados.

PLANO 1

No cinema. D. Almira, uma senhora de 60 anos, assiste o filme segurando uma caixa de bombons. D. Noélia, também de 60 anos, senta-se ao seu lado.
NOÉLIA – Igualzinho como antes!
ALMIRA – Só estava esperando você chegar pra abrir o pacote.
Abrem o pacote e começam a comer os bombons.
NOÉLIA – Pena que o cinema não é o mesmo.
ALMIRA – Aquele fechou faz muitos anos. Teve uma época que virou igreja.
NOÉLIA – Que horror. É um pecado fecharem um cinema pra transformar em igreja.
ALMIRA – Lembra o último filme que assistimos?
NOÉLIA – Claro que lembro. Os dois atores já morreram.
ALMIRA – Os atores já morreram. O cinema já fechou. E tanta coisa aconteceu com a gente.
NOÉLIA –  O gosto do bombom continua o mesmo.
Elas se olham. Comem os bombons olhando pra tela.
ALMIRA – E agora?
NOÉLIA – Agora a gente sai de fininho para a praça.
ALMIRA – Igualzinho como antes.

PLANO 2


Dr. Alberto fala ao telefone.
DR. ALBERTO – Tudo agendado para hoje à noite? Sem vacilo, Mustafá! Negócio simples, rápido e caceteiro, tá ouvindo?  E a outra ação na zona leste? Tudo perfeito? Assim, que eu gosto, Mustafá. Hoje, vocês vão arrebentar com tudo lá.




Entra Ching com um pacote na mão. 
DR. ALBERTO – (Enquanto fala ao telefone, pergunta com gestos o que tem no pacote) Quem chegou? Passa pra ele, Mustafá. Passa pra ele agora. Filho da puta! (Ching sinaliza que o pacote não tem remetente) Feitosa? Ô, companheiro.  Que é isso, Feitosa? Sou correto com os amigos! Vou arrebentar aquela merda hoje, meu querido, pode confiar.  Já tem gente minha dentro da Câmara pra limpar qualquer sujeira, ta ouvindo? Não tem erro. (Para Ching) Que porra é essa, Ching?

CHING – Deixaram com a secretária.

DR. ALBERTO – Abre essa merda. (ao telefone) Porra, Feitosa, to perdendo a paciência. Sai daí e confia que meu pessoal precisa começar a ação e você está atrapalhando. Que outra vez? Da outra vez também deu certo. Só morre, quem vacila, Feitosa. Você entendeu? Agora sai daí.   

Ching vai tentando abrir. O telefone dele toca. Ele para de mexer o pacote.

CHING – Doutor. A Jéssica saiu pelo telhado.

DR. ALBERTO – (ao telefone) Resolve com o Mustafá e sai daí, tá ouvindo? (desliga) Esse Feitosa está querendo me foder. Como é que é?

CHING – A Jéssica.

DR. ALBERTO – Como é que é?

CHING – Fugiu, doutor. Pelo telhado.

DR. ALBERTO – (suspirando pra conter a raiva) Vocês tão querendo me foder. Eu não mandei vigiarem essa menina?

CHING – Tinham uns dez cuidando disso, doutor.

DR. ALBERTO – E como é que uma menina de 16 anos conseguiu dar a volta em dez homens, Ching?

CHING – Decerto não imaginaram que ela ia fugir pelo telhado.

DR. ALBERTO – Ela tá querendo me foder (toca o telefone. Ele já reagem prevendo mais problema) Tá todo mundo querendo me foder! Alô!(Para Ching) Manda o Marilon rastrear a menina! (Ao telefone) Como é? Dom Corleone? Puta que pariu, você tá de sacanagem! (Para Ching) Abre logo esse pacote, cacete!

PLANO 3

Gustavo está em um ônibus com outros passageiros. Estão todos irritados com a vagareza do motorista.
HOMEM 1 (comentando com o Homem 1) Ele tá passeando? Ele está passeando! Eu tenho mais o que fazer!
HOMEM 2 – Vou falar com ele. (para o motorista) Ô Amizade!
MOTORISTA – Tá vendo a placa? Proibido falar com o motorista.
HOMEM 2 – Acelera um pouquinho aí, meu irmão. Tá todo mundo com pressa!
A senhora que está ao lado de Gustavo puxa conversa.
SENHORA – Uma flor tão bonita. Desse jeito vai murchar com a lerdeza desse homem.
GUSTAVO – Mais rápido aí, motorista!
MOTORISTA – Tô fazendo o meu trabalho! Se corre, uns reclama, se vai mais devagar, outros reclama.
Som de buzina de um carro pequeno que está querendo ultrapassar.
HOMEM 2 – Mas é folgado. Anda devagar e ainda toma a estrada toda. Não deixa nem os outros carros adiantar o lado.
HOMEM 1 – O carro pequeno tá xingando ele todo!
O motorista faz uma curva abrupta pra deixar o carro passar.
MOTORISTA – Vai, passa, maluco! Daqui a pouco sai com uma arma aí pra me matar! Esse povo fica tudo é doido na estrada. É por isso que meio dia a gente vê tanta barbaridade no jornal! É melhor devagar, que assim ninguém morre.

PLANO 2

Ching tenta abrir o pacote.

DR. ALBERTO -  Já falei que tem gente minha infiltrada, meu querido. Calma, meu amigo. Fica calmo. (para Ching) Me liga com o Prestes. (Ching deixa o pacote para fazer a ligação) Basta um telefonema meu e...eu vou ligar agora, tá entendendo. Calma que eu já estou resolvendo. (Ching entrega o telefone para Dr. Alberto e volta a tentar abrir o pacote) Prestes! Meu querido! Como é que tá a família? Pois é, meu querido. Eu acabei de saber. Que porra é essa de operação Dom Corleone, Prestes? A Polícia Federal tá querendo me foder!

Toca o celular de Ching.

CHING - Rastrearam a Jéssica.

DR. ALBERTO – (ao telefone) Se chegar em mim, eu fodo com meia Brasília, Prestes! (para Ching) Onde é que ela tá?

CHING – Tem dez minutos que parou em um estúdio de tatuagem.

DR. ALBERTO – Outra tatuagem? Essa menina quer me foder. (para o telefone)  Ajeita isso aí pra gente, Prestes!

CHING – É pra tirar ela de lá?

DR. ALBERTO – Não, só continua vigiando. (ao telefone) Vai sobrar pra todo mundo!  Se eu for, levo todo mundo, Prestes!

 Ching volta a abrir o pacote.
DR. ALBERTO – Não dá pra cancelar a ação, meus homens já foram. Porra, Prestes, você quer me foder? Você sabe quanto dinheiro a gente vai perder? Não quero nem saber, você tem que dar seu jeito.
CHING (Mostrando uma vaca de pelúcia que estava dentro do pacote) – Dr. Alberto?
DR. ALBERTO – Não tem gente sua na Polícia Federal? (para Ching) Que porra é essa? Uma vaca? Que brincadeira é essa?
CHING – Dr. Alberto. Tá fazendo um barulhinho. Acho que é uma bomba.
PLANO 1
D. Almira e D. Noélia conversam em uma praça.
NOÉLIA – (olhando ao redor )Como está abandonada.
ALMIRA – Muita coisa nessa cidade ficou abandonada desde que você foi embora.
NOÉLIA – Quando cheguei notei logo a diferença. Foram muitos anos fora. O abandono é muito claro.
ALMIRA – Eu que fiquei não percebo tanto assim. Sou parte dessa cidade, dessa paisagem. Abandonada como ela.
NOÉLIA – Não fala assim.
ALMIRA – Não estou reclamando.
NOÉLIA – Lembra das nossas tardes tomando sorvete? Ainda servem aqueles bolinhos?
ALMIRA – Nunca mais fui lá.
NOÉLIA – Por que?
ALMIRA – Pra não lembrar.
NOÉLIA – Eu nunca quis esquecer.
ALMIRA – Você foi embora. Lembrar é doloroso pra quem fica.
NOÉLIA – Trouxe umas fotos pra te mostrar. De algumas viagens.
ALMIRA – Você conheceu muitos lugares?
NOÉLIA – Muitos. Foi a parte boa de ter me casado com ele. Não, não posso ser injusta. Ele se esforçava pra ser bom marido. Eu que demorei demais pra reconhecer isso. Eu tive muita raiva por ter sido obrigada.
ALMIRA – Então você se divertiu.
NOÉLIA – Eu me diverti. Eu tive filhos, eu viajei. Eu vou ser avó! Tudo isso me ajudou a levar a vida. Me ajudou a chegar até aqui.
ALMIRA – Pois pra mim, aqui, sozinha, o tempo demorou de passar.
NOÉLIA – E  por que não formou uma família também?
ALMIRA – Não era isso que eu queria. Você sabe. Nunca me conformei.
NOÉLIA – Mas não foi isso que a gente combinou.
PLANO 3
Gustavo está impaciente. Tenta ligar, mas o celular não quer  pegar.
GUSTAVO – Faço essa viagem toda semana. Uma hora dessa outro motorista já tinha passado a ponte. E a gente já estava chegando.
SENHORA – O senhor vai e volta toda semana?
GUSTAVO – Trabalho na capital. Minha mulher e meus filhos ficam por aqui. Mas vejo eles todo fim de semana.
SENHORA – Que bom que o senhor conseguiu vir mais cedo dessa vez. Faltam dois dias pra sábado ainda.
GUSTAVO – Tive que vir mais cedo.
HOMEM 1 – Bora, motorista!
HOMEM 2 – Bota pressão, minha gente! Se a gente não reclama, a gente só chega amanhã!
SENHORA – Vai comemorar né, filho! Essa flor tá muito bonita! É aniversário da sua esposa?
GUSTAVO (Aflito com a demora) Não.
SENHORA – Toda semana o senhor leva for pra ela? Que bonito!
GUSTAVO – (tentando ligar, aflito) Devia ter tido essa ideia. Sem sinal. (olha o relógio)
HOMEM 1 – Tá de pirraça esse motorista, só pode ser.
HOMEM 2 – Tá diminuindo! O sacana tá diminuindo a velocidade!
Os dois homens se aproximam pra reclamar com o motorista.
MOTORISTA – É acidente.
HOMEM 1 É o carro pequeno que passou pela gente.
HOMEM 2 – O que é aquilo alí na frente?
MOTORISTA – É um bicho. O carro pequeno atropelou um bicho grande!
HOMEM 1 – É uma vaca. No meio da estrada! É agora que a gente não chega.
PLANO 2
DR. ALBERTO – Quem mandou isso, Ching?
CHING – Não tinha remetente, doutor.
DR. ALBERTO – Larga essa porra e vamos sair daqui.
CHING – Acho que não vai dar tempo, doutor.
DR. ALBERTO – Dá pra desarmar?
CHING – É a única chance. (tenta desarmar a bomba)
DR. ALBERTO – Quem mandou essa bomba? Quem mandou? Não dá pra saber quem mandou. Tá todo mundo querendo me foder! Jéssica! Cadê minha filha?
CHING – Acho que ainda está no estúdio de tatuagem.
DR. ALBERTO – Ela não pode voltar pra cá agora. Quem mandou essa porra dessa bomba! Quem é que tá querendo me explodir com tudo? Com testemunha, documentos, com tudo! Puta que pariu, é alguém de Brasília!  Só pode ser!
Som de mensagem do celular de Ching. Dr. Alberto pula de susto.
CHING – Mensagem do Marilon. A Jéssica ainda está fazendo a tatuagem.
DR. ALBERTO – Mais uma porra de uma tatuagem. Essa menina tá me deixando louco! Pelo menos ela não tá aqui. Tanta coisa pra acertar com essa menina! Tanta coisa que ela precisa entender!
Ouve-se um clique. Ching olha para Dr. Alberto.
DR. ALBERTO – Conseguiu?
PLANO 3
MOTORISTA – Olha aí. Castigo. Tanta pressa pra quê? Esse povo com pressa não sabe viver.
GUSTAVO - Como é que a gente faz pra sair daqui?
HOMEM 1 (Se aproximando) – Não morreu não, tá só machucado.
MOTORISTA – A vaca?
HOMEM – O homem do carro pequeno.
MOTORISTA  – E a vaca?
HOMEM 2  - Sinal! Tá pegando o celular! A gente chama a polícia ou a ambulância?
Gustavo pega seu celular e, aflito, faz uma ligação.
GUSTAVO – Oi. Como ela está? Teve um acidente na estrada. Eu tô bem... E ela? (triste) Tá indo? Não vai dar tempo... Eu não acredito. Coloca o telefone no ouvido dela. É o único jeito. (pausa) Raquel. Sou eu. Eu não sei se você consegue me escutar de onde você está. Do jeito que você está. Eu fiz de tudo pra estar aí com você. Eu procurei muito por essa flor aqui na minha mão. Ela é branca e azul, como você gosta. Raquel, eu não queria que fosse assim. A gente merecia uma despedida melhor. Será que você consegue ficar só mais um pouco, até eu chegar aí? Eu sei que já te pedi tanta coisa nessa vida. E você sempre, sempre me atendeu. Eu queria te dizer, Raquel, olhando pra você, que você vá feliz. Que pode ir tranquila, que vou cuidar de tudo aqui pra você. Eu...Eu não consigo.
A Senhora que ouvia a conversa se aproxima dele para dar apoio.
GUSTAVO – Alô! O quê? (fala para a mulher) A frequência cardíaca se alterou.
SENHORA – Então continua falando com ela. Ela está te ouvindo.
GUSTAVO (ao telefone) – Raquel. Você me esperou tantas vezes. Tantas vezes eu fiz essa mesma viagem. E você cuidou de tudo pra mim. E quando eu chegava você estava sempre pronta pra mim. Eu queria que você me esperasse um pouco mais. Desligaram.
SENHORA – Ela te ouviu.
PLANO 1
D. Noélia mostra fotos para D. Almira
NOÉLIA – Essa foi a última viagem que fiz antes de voltar pra cá. Olha como é bonita a Índia! Olha que confusão bonita! Tanta gente, tanta cor!
Almira não presta muita atenção nas fotos
NOÉLIA – Estava tão animada pra te mostrar.
ALMIRA – Você viveu. Foi feliz. Esqueceu de mim.
NOÉLIA – Eu só fiz o que a gente combinou.
ALMIRA – Eu fiquei sozinha.
NOÉLIA – Todas as fotos que eu tirei, de todos os lugares que fui, foi pensando que eu dia eu ia mostrar pra você.
ALMIRA – Eu não tenho nada pra te mostrar.
NOÉLIA – Não foi esse o combinado. Você está triste por que eu cumpri o combinado?
Almira não responde
NOÉLIA - A gente combinou de se guardar uma pra outra. Sem sofrimento. Sem deixar a impossibilidade matar a gente por dentro. A gente combinou de se manter limpa, nova, em plena juventude. De começar de onde paramos. De onde não deixaram a gente viver.
ALMIRA - Eu tentei. Por você, eu tentei. Mas o tempo, a família, as obrigações, essa vida tão sem graça que eu levei aqui... Eu tive muita raiva. Tiraram você de mim.
NOÉLIA - Achavam que estavam fazendo o certo. A gente mesmo às vezes pensava que nós duas juntas era muito errado! Mas a gente aqui, hoje, depois de tanto tempo...isso prova que não era errado. Não era.
ALMIRA - Você ainda sabe me fazer chorar.
NOÉLIA – Vamos continuar vendo as fotos. Fiz essa viagem pensando em você.
PLANO 3
HOMEM 2 (falando ao celular) - Uma vaca caída no meio da estrada! Não passa carro nenhum! Quanto tempo?
Gustavo e a senhora estão parados no acostamento.
GUSTAVO – Foi de repente. Estava tudo bem quando eu deixei ela lá. Cuidando das crianças, como sempre. Cuidando de tudo pra mim. De repente. Quando me ligaram, ela já estava no hospital. Já não tinham mais esperança.
SENHORA -  A vida de vocês foi boa?
GUSTAVO – Eu não sabia que tinha sido tanto. Nunca aconteceu nada nessa estrada e justo hoje... não vai dar tempo de me despedir.
SENHORA – Pra quê sofrer com despedida? Se a vida de vocês foi boa, então ela sabe. Está tudo certo.
GUSTAVO – Eu devia ter passado menos tempo longe.
SENHORA – Aí a vida de vocês teria sido perfeita. E isso não existe.
GUSTAVO – Ela vai me esperar. Como sempre esperou. Pela última vez.
HOMEM 2 (Desligando o telefone) - Bote aí uns quarenta minutos só pra chegarem. O dia hoje vai ser longo!
HOMEM 1 – Pior é que eu tô com uma fome!
Tira uma garrafinha de água mineral da bolsa.
SENHORA – Vamos molhar um pouquinho essa flor. Assim ela aguenta esperar um pouco mais.
Molha a flor que Gustavo está segurando.
SENHORA – Mas se não aguentar, não tem importância. Você sempre vai lembrar de como esta flor é bonita.
PLANO 2
CHING – Ela tem dispositivo reserva.
DR. ALBERTO - Quem mandou essa porra queria mesmo me foder. Quem mandou? Será que foi o pessoal do Feitosa? Ele estava muito confiante no telefone! O pessoal do Feitosa tá querendo assumir a Zona Leste, só pode ser!
CHING – Dr. Alberto, eu sinto muito.
DR. ALBERTO – Ainda nada?
CHING – Nada.
DR. ALBERTO – Continua tentando! Continua! Vivendo com ela, todos os dias e deixei de falar tanta coisa com a Jéssica. Eu preciso me acertar com essa menina! Ela ainda acha que eu matei a mãe dela! A mãe dela vacilou, eu não tive culpa! Ela ainda não entendeu que só morre quem vacila!
CHING – Não tem jeito.
DR. ALBERTO – Todo mundo querendo me foder! O Feitosa, o Prestes. A Polícia Federal!
CHING – Essa bomba vai estourar a qualquer momento.
Som de mensagem do celular de Ching.
DR. ALBERTO – Eu tenho que falar com a Jéssica!
CHING – Dr. Alberto.
DR. ALBERTO – Me liga com a Jéssica!
CHING – Dr. Alberto. Ela está tatuando uma bomba no ombro.
DR. ALBERTO – Ela o quê?
CHING – Chegou a hora Dr. Alberto.
Dr, Alberto olha pega a vaca de pelúcia.
DR. ALBERTO – Essa vaca...
CHING – Acabou.
DR. ALBERTO – Fui eu que dei pra ela essa vaca!
CHING – É agora.
DR. ALEBERTO – Jéssica!
Som de explosão. Black.
PLANO 1
NOÉLIA – Essa é a foto que eu mais gosto.
ALMIRA – Uma vaca?
NOÉLIA – Na Índia as vacas são sagradas. Consideradas animais puros. Podem circular onde quiserem e fazer o que bem entendem. Elas são respeitadas, cuidadas até enfeitadas, olha? Até as fezes e urinas das vacas são usados em rituais de purificação.
ALMIRA – A vida lá fora parece tão mais simples.
NOÉLIA – Tem uma música que meu filho cantava: “Tudo é tão simples que cabe num cartão postal. E se a história é de amor, não pode acabar mal”. Nas próximas viagens você vai comigo.
Elas se olham e se dão as mãos.
ALMIRA – Mas antes nós vamos naquele baile.
NOÉLIA – Aquele baile ainda existe? No mesmo lugar? Do mesmo jeito?
ALMIRA – Claro que não! O espaço é o mesmo, mas por dentro e por fora mudou uma porção de coisas. A música que tocam também não é a mesma. Mas eu acho que ainda tem uma alma daquele tempo. Vai ser bom ir lá com você.
NOÉLIA - E de lá a gente ganha o mundo!
ALMIRA – A gente ganha do mundo.
Saem abraçadas e felizes.
 FIM
Tema escolhido pelo público:

TODA FORMA DE AMOR VALE A PENA
Dramaturga convidada: Thais Alves
Dia: 16.10.2012 (terça)


O público do dia 16.10.2012
Elenco conidado: Lulu Pugliese, Milena Flick, Gabriel Camões, Igor Epifânio, Fabio Ferreira e Bruno de Sousa
Diretor convidado: Bertho Filho
Técnicos convidados: Karina Allata (figurino e maquiagem), Fernanda Mascarennhas (iluminação), Adriana Prates (DJ), Alessandra Novhais (fotografia), Fred Alvim (ambientação do espaço), Raquel Maciel e Carlos Alberto Ferreira (produção)
Coordenação artística: Cristiane Barreto
Cabaré dos Novos - Teatro Vila Velha -  Salvador. BA
Personagens:

Narrador
Homem1
Homem2
Mulher
Homem
Vizinho do meio

 LOCAL: Apartamento de Três Andares.

(SOM AMBIENTE.  ENTRADA DA PLATEIA).

NARRADOR - Boa noite. Tudo aqui agora acontece de repente. A peça começa de repente....e acabará...ainda não sei, estou no processo da coisa....Bem....A peça será escrita de forma explicatica e ocasional...Então...Começarei: O Público entra. A peça inicia-se com bate papo entre atores e plateia . A sonoplasta coloca um som com barulhos de latidas de cachorros. os atores  sentam no palco. o  figurino dos atores são de roupas Havaianas, nada tem muita lógica até então.... Como amor, sem lógica até então....! Ah, falei do amor... Por que? O tema é o amor. Dentro desse tema, mil temáticas. ...Bem....Voltemos aos acontecimentos:  Muito bem....E agora...A  sonoplasta solta uma música... tempo passa....O Tempo é algo que não se "mede". Um minuto pode parecer um ano, e um ano pode parecer um minuto... ! Ê....frase meio clichê essa que disse agora...Mas estou aqui "sozinha", e converso com o tempo...Até penso nos meus amores... tão vastos, tão diferentes, tão infinitos...Hmmmm....Não irei devanear....Que eu seja prática para falar de amor. Prática? Parece ironia comigo mesmo, ser prática no amor?"....os atores estão indo de mesa em mesa para conversar com a plateia..... Enquanto isso....Recebo um bombom de chocolate de uma das atrizes. Abro. Como. Dou uma primeira dentada. Cupuaçu. Lembrei de um amor antigo; amava cupuaçu. Esse "passou".Amores não passam.... Dei uma segunda dentada. Lembrei de amores atuais. Não sei se gostam de cupuaçu.....Acho que irei perguntar...?!... Obsevo tudo. O amor escorre no meu coração...Penso nos meus amores. Penso que o amor é clichê, é  tudo igual. Volto para a cena.  Tudo será representado agora. O teatro vai começar....ou ja começou desde que sentei aqui? Ah, sei não, vai começar...

ATOR 1- Boa noite, sou ator, irei ler a indicação escrita pelo público....( SONOPLASTIA DE TEMPO PASSANDO).... E Vamos iniciar a  peça. Primeira Cena! Um momentinho: Eu acho que o narrador poderia ler  isso aqui...e nos representamos....

NARRADOR- Era uma vez  dois Casais ( dois homes/ uma mulher e um homem). O  Local: Andar de cima/Andar de Baixo. O  Primeiro casal, os dois homens. O assunto deles?! Falando do primeiro encontro deles. Existe um clima  de amor entre eles, mas percebe-se um tom  de cobrança  de um para o outro.  O  Segundo casal; uma mulher e um homem. Assunto : Quase Nada, eles ouvem a conversa dos vizinhos, do casal acima. o estimulo das suas vidas de casados, é a vida de casado do casal acima, ouvir as conversas deles....Que viagem !!! Cada um tem um tesão, uma perversão.... A vida é assim, não entre em julgamento você com você mesma!!! Ok..Voltando: Na história desse tema proposto TODA FORMA DE AMOR VALE A PENA existe um terceiro elemento: o vizinho, este  que chegará para interromper  e provocar os casais....Enfim.... Vamos ao teatro!!! Ou ja começou desde que sentei aqui?

(ENTRA UMA TRILHA DE INICIO DE PEÇA- A SONOPLASTA QUE SENTE O CLIMA)

NARRADOR- Foco no segundo  casal que mora embaixo. Eles estão falando qualquer coisa, falando de plantas. 
HOMEM- Plantas, plantas....Você só fala disso
MULHER- E você não tem assunto....
HOMEM- Psiu! Espera, esta ouvindo?! Eles começaram de novo a falar...Vem, vem, agora a gente enlouquece, meu amor, de paixão...!!
MULHER- Aiii esse casal é a salvação da nossa vida sexual....!!!!!!!
NARRADOR-  o Foco  se transfere para o primeiro casal. Eles estão dizendo que este dia é uma data  especial...
HOMEM 1- Você lembra que dia é hoje?
HOMEM 2- claro que lembro....
HOMEM 1- Não lembra coisa nenhuma...! Já chegou aqui querendo ir embora....
NARRADOR-Foco para  o segundo casal que aguarda as conversas alheias. 
HOMEM- E tão falando baixinho hoje, não é?
MULHER- Me dá uma raiva, mas uma raiva quando eles falam baixo!
HOMEM-(PARA O CASAL DE CIMA) êeee por acaso aqui tem algum surdo???? falem mais alto!!!!
NARRADOR- o casal acima surpreendidos.
HOMEM 1- quem será esse louco?
HOMEM 2- acho que é o casal  de baixo....
HOMEM 1- Oscar veja bem, não mude de assunto....Esqueça esse casal...Você ta querendo fugir das minhas acusações...você esqueceu a nossa data.
NARRADOR- Ouve-se o grito do vizinho de baixo.
HOMEM- Mais altoooooooooooooooooooo!!!
NARRADOR- A campanhia da casa do casal de cima  toca. Um deles abre.
HOMEM 1- Vai lá...deve ser o louco que tá gritando....Ou  de repente um amante seu, não é verdade?
HOMEM 2- Deixa disso Mario, você sempre desconfiando...Eu te amo....
NARRADOR-A campanhia toca insistentemente.
VIZINHO DO MEIO- Olá boa tarde!
NARRADOR- um novo personagem: o vizinho do meio aparece.
(ENTRA UMA MÚSICA PARA APRESENTAR O VIZINHO DO MEIO).
VIZINHO DO MEIO- Boa noite....Meu chuveiro tá com defeito, de modo que não estou conseguindo resolver....
HOMEM 1-  vá lá, vá Oscar, deve ser um dos seu amant....
VIZINHO DO MEIO- amant...? O que amigo? vocês são...?
HOMEM 1- Não, não não disse nada...Tava cantando uma música....
NARRADOR- HOMEM 1 falando baixo.
 HOMEM 1- vou lá rapidinho e volto.
NARRADOR- Foco no casal  de baixo.
HOMEM- o que tá rolando lá? Será que é um terceiro elemento? Uma ménage a tróis?
MULHER- ahhh, não, isso eu não admito, eles dois são nossos...sou liberal até certo ponto, mas daí a passar por cima da nosso romance com eles.....
NARRADOR- O homem 2 retorna....
HOMEM 2- pronto amor, já resolvi, foi um problema na eletricidade....
HOMEM 1- ok....vamos esquecer isso....vou colocar uma música.
NARRADOR- Colocam uma música e dançam.
HOMEM 1- Amo dançar com você....você é tão bom, tão maravilhoso e eu fico com esse ciúme.
HOMEM 2- bobagem, vem....!
NARRADOR- Foco no segundo casal.
HOMEM- O que eles tem hoje?
MULHER- Com certeza Colocaram  uma música alta para nos perturbar.... até curto a música, mas não tô ouvindo o que ta rolando lá.....
HOMEM- Falem altooooooooooooooooooooooooo pelo amor de Deus!!!
NARRADOR- O casal de cima ouve os berros e os pedidos e começam a falar alto.
HOMEM 2- vamos morar juntos?
NARRADOR- o segundo casal começa a achar que eles estão fazendo a proposta para eles.
HOMEM- Eita....assim tão rapido....!
MULHER- Eles já querem que a gente vá morar com eles
HOMEM- ah esse povo tem umas carências...Mas é tanto amor....
MULHER- é amor meu bem, é amor....
NARRADOR- Volta à cena para o segundo casal....
HOMEM 2- Então diz, vamos morar juntos?
HOMEM 1- Eu, eu, eu....
NARRADOR- O Segundo casal entra bruscamente interrompendo.
HOMEM E MULHER- Topamos!
OS DOIS HOMENS -Hã???
NARRADOR- O vizinho do Meio aparece.
VIZINHO DO MEIO- Queridos...!!!
NARRADOR-  Agora estão os dois casais e o vizinho na sala da casa do casal de cima. O segundo casal fala que se excita muito com as conversas do primeiro...Um constragimento...Algo sexual ficou no ar. O vizinho fala sobre troca de casais; ele parece sempre ser a ponte que tenta solucionar as histórias..
HOMEM 1: Que loucura é essa???
HOMEM 2- Topam o quê?
MULHER- Vocês não pediram para a gente morar juntos....?
Eu sei que será algo fora dos padrões...
VIZINHO DO MEIO: Eita lasqueira....Uma suruba, é?
HOMEM 1- Eu não estou entendendo mais nada....
HOMEM- Cara, não tem o que entender, nossas vidas estão ligadas....Um encontro de amores....
VIZINHO: Olha só, eu diante da situação que me encontro....Eu topo!
HOMEM 2- Mas a proposta não era para vocês.....
MULHER - Meus amores deixem de orgulho.... o amor quebra barreiras,  acaba com certezas, desaba orgulhos, espalha poderes, arrasa com o impossível....
VIZINHO DO MEIO- Você fala tão bonito....
HOMEM 2- Então, o que faremos Mario?
HOMEM 1- Vamos dizer que sim....Quem sabe isso não foi uma pegadinha do destino PARA AS NOSSAS VIDAS TEREM MAIS MOVIMENTOS!
VIZINHO DO MEIO- Poliamor, é?
TODOS - sim!!!
NARRADOR- E foi depois desse dia.... uma linda história de amor surgiu entre Mario, Oscar, Julieta ( esse é o seu nome), Fernando ( o homem) e Pedro ( o Vizinho do meio)...E viveram Felizes sempre!!! Ironia da vida...e eu aqui com o meus amores também...Dou a última dentada no bombom de cupuaçu, fecho o computador....e meu celular toca: São eles...Meus amores!
FIM


Tema escolhido pelo público: Salvador: Não sei se vou ou se fico.
Dramaturgo convidado: Vinnicius de Morais
Dia: 23.10.2012 (terça)

O público do dia 23.10.2012

Elenco conidado: Lulu Pugliese, Milena Flick, Gabriel Camões, Igor Epifânio, Fabio Ferreira e Bruno de Sousa
Diretor convidado: Caíca Alves
Técnicos convidados: Karina Allata (figurino e maquiagem), Fernanda Mascarennhas (iluminação), Adriana Prates (DJ), Alessandra Novhais (fotografia), Fred Alvim (ambientação do espaço), Raquel Maciel e Carlos Alberto Ferreira (produção)
Coordenação artística: Cristiane Barreto
Cabaré dos Novos - Teatro Vila Velha - Salvador. BA
SALVADOR TÁ FELIZ
Texto de Vinnicius Morais

Personagens:

Assaltante
Rapaz
Baiana do acarajé


Ponto de ônibus.
Em cena, um rapaz e uma baiana de acarajé. Entra o assaltante.

ASSALTANTE
Beleza, bróder. Tem hora aí?
RAPAZ
Cinco e quarenta.
ASSALTANTE
Já? Porra... Passe a grana.
RAPAZ
É...
ASSALTANTE
Passe a grana, viado.
RAPAZ
É comigo?
ASSALTANTE
To com uma faca aqui na sunga.
RAPAZ
Peraí, cara.
ASSALTANTE
Peraí, o caralho.
RAPAZ
Eu não tenho nada não.
ASSALTANTE
Como não tem, bróder? E o celular?
RAPAZ
Não é meu.
ASSALTANTE
Não é seu mermo não, porque agora é meu. Me dê. Me dê, mermão! Que porra é essa?
Coopera com o meu trabalho, que eu coopero com o seu.
RAPAZ
O meu? Que meu?
ASSALTANTE
De assaltado.
Rapaz entrega o celular.
ASSALTANTE
Não fica olhando pra baixo, porra. Vão pensar que sou marginal. O dinheiro.
RAPAZ
Não tenho.
ASSALTANTE
O dinheiro!
RAPAZ
Não tenho!
ASSALTANTE
Nem pro busu, sacana?
RAPAZ
Só pro busu!
ASSALTANTE
Aí, tá vendo? Depois morre e reclama que a culpa é do ladrão. Fica mentindo.
RAPAZ
Eu não tenho como voltar pra casa.
ASSALTANTE
Tem quanto aí?
Rapaz mostra cédula de dez reais.
ASSALTANTE
Cê tá pior que eu, bróder. Cê é professor, é?
RAPAZ
Sou.
ASSALTANTE
Porra, que humilhante. Vou trocar. Me dê. Me dê!
Rapaz entrega a cédula.
ASSALTANTE
Fique aí. Senão atiro.
RAPAZ
Mas você...
ASSALTANTE
Pshh! Cale a boca.
Assaltante aproxima-se da baiana.
ASSALTANTE
Troca dez?
BAIANA
Tô sem, meu nego.
ASSALTANTE
Porra... Tem cocada?
BAIANA
Ô nego, cê acredita? Esqueci em casa.
ASSALTANTE
Porra, baiana, sério?
BAIANA
É a pressa, nego. Busu tá cada vez mais cheio pra chegar aqui.
ASSALTANTE
Salvador tá foda.
BAIANA
Demais.
ASSALTANTE
Me vê duas coca.
BAIANA
Qual coca?
ASSALTANTE
De limão.
Assaltante paga, Baiana entrega duas latas com canudos e o troco.
Assaltante volta para o rapaz e entrega-lhe uma lata.
RAPAZ
De limão?
ASSALTANTE
Bebe não?
RAPAZ
Bebo.
ASSALTANTE
Salvador tá foda. Até pra marginal.
RAPAZ
Por quê?
ASSALTANTE
Cê vai assaltar o cara, é só cinco, dez real. Bebe logo essa porra desse sprite, tá um calor
retado.
RAPAZ
To bebendo!
ASSALTANTE
Não to tirando quase nada na rua, véi. Assim vou ter que procurar emprego.
RAPAZ
Cê sabe fazer o quê?
ASSALTANTE
Sei fazer nada já ajudei em construção. Mas paga muito pouco. Melhor curtir a praia e
assaltar uns otário. Sem querer ofender, tá ligado. Eu queria tá na escola. Recebendo o
bolsa. Mas meu pai matou minha mãe na faca. Aí matei meu pai. Aí é foda, né, bróder.
RAPAZ
É...
ASSALTANTE
Salvador tá foda. Muita violência. O segredo de tudo é a educação. Sem educação não tem
país, não tem, as coisa que é pra ter, né? Segurança, hospital direito. Cês são a
base, bróder.
RAPAZ
Obrigado.
ASSALTANTE
Dou valor a professor. Tem uns que são filho da puta, mas também, melhor tá na sala
inducando que tá na rua matando.
RAPAZ
Com certeza. Terminei.
ASSALTANTE.
Então rapa daqui, bróder, se não quer morrer. Pega esse busão aí.
RAPAZ
Mas não é o meu.
ASSALTANTE
Cê vai pra onde?
RAPAZ
Boca do Rio.
ASSALTANTE
Pega esse mermo, vá, vá, vá!
RAPAZ
Alto de Coutos?
ASSALTANTE
Sobe, vá, vá! Vou tirar a faca da sunga.
O rapaz pega o ônibus.
ASSALTANTE
Na moral, véi. Ô baiana, quanto tá o acarajé?
BAIANA
Com camarão, seis; sem, cinco.
ASSALTANTE
É pra turista, é? Porra, que assalto é esse?
BAIANA
É o aumento do dólar, nego. Imposto tá tudo mais caro.
ASSALTANTE
É nisso que dá. Trabalhar na legalidade.
BAIANA
Fale não.
ASSALTANTE
Porra, esses governante é tudo ladrão. Só tomam dinheiro da gente.
BAIANA
Vai querer?
ASSALTANTE
Tô só com três.
BAIANA
É nego. Tá difícil pra todo mundo.
ASSALTANTE
Salvador tá foda.

FIM


Tema escolhido pelo público: Eu moro numa faixa de pedestres
Dramaturgo convidado: Aldri Anunciação
Dia 15.10. 2012 (segunda)

O público do dia 15.10.2012

Elenco conidado: Lulu Pugliese, Milena Flick, Gabriel Camões, Igor Epifânio, Fabio Ferreira e Bruno de Sousa
Diretor convidado: Daniel Guerra
Técnicos convidados: Karina Allata (figurino e maquiagem), Fernanda Mascarennhas (iluminação), Adriana Prates (DJ), Alessandra Novhais (fotografia), Fred Alvim (ambientação do espaço), Raquel Maciel e Carlos Alberto Ferreira (produção)
Coordenação artística: Cristiane Barreto
Cabaré dos Novos - Teatro Vila Velha -  Salvador. BA

PERSONAGENS:

Personagem A
Personagem B
Personagem C
Personagem D
Personagem E

CENÁRIO – Palco vazio circundado por diversos cones de trânsito, que são deslocados durante a cena.

FIGURINO – Camisas e calças listradas em preto e branco.

ATO ÚNICO

CINCO PESSOAS SURGEM NO PALCO. ESTRANHAM-SE EM UM PRIMEIRO MOMENTO. PERCEBEM OS DIVERSOS CONES ESPALHADOS NO ESPAÇO, E EM ACORDO SILENCIOSO COMEÇAM A AJUSTÁ-LOS EM LUGARES ALETÓRIOS DO PALCO. ENQUANTO IMPROVISADAMENTE BUSCAM LOCAIS MAIS ADEQUADOS PARA CADA CONE, INICIAM DE SÚBITO UM DIÁLOGO.

CENA 01
A-Qual a importância de um tema na vida da gente? Na vida das pessoas? O que é um tema?
B-O tema é uma música. Não é?
C- Não, meu filho! Você tá confundindo com tema musical de filmes
D-(ENTUSIASMADO) Não! Ele está certo! O tema pode ser uma música... algo pra dançar!
C – (DEFINITIVO) Não! Aqui, o tema é algo que tem a ver com o que vai ser dito ou apresentado por nós!
B - (HESITANTE) Nós quem?
C – Nós aqui no front!
B – Você acha que numa altura dessas ainda existe algo a ser dito?
A – (EXALTADO) Eu não tenho mais nada a dizer. Tudo já foi dito. Todas as frases! Não existe uma palavra sequer que nunca foi dita um dia por alguém nesta vida! (PEGA UM CONE) Todas as coisas já foram traduzidas em palavras, desde o primeiro dia das suas existências. E não somos nós que iremos descobrir algo novo a dizer. (COLOCA O CONE NO CANTO ESQUERDO DO PALCO) Eu me recuso a definir um tema nos dias de hoje!
B- Calma!
A – Calma o quê? Eu não tenho nada a dizer. (REFERINDO-SE AO PERSONAGEM B) Você tem algo a dize? (REFERINDO-SE AOS OUTROS PERSONAGENS) Quem tem algo a dizer?

PAUSA.

TODOS ENTREOLHAM-SE, E FINALMENTE ENCARAM (OLHAM) A PLATEIA.

D – (REFERINDO-SE À PLATEIA) Eles... têm algo a dizer.

MÚSICA ESTRANHA CANTADA POR NINA HAGEN INVADE O AMBIENTE. O GRUPO DE ATORES COMEÇA A AJUSTAR DIVERSOS CONES DE TRÂNSITO EM FORMATO DE UM CIRCULO, PERMANECENDO-SE TODOS DENTRO DO CIRCULO DE CONES.

DE REPENTE SILÊNCIO.

B – Espere! Eu tive uma ideia! Existe algo que ainda pode ainda ser dito! Vamos falar sobre o que está acontecendo exatamente agora. Pois se está acontecendo agora, ninguém nunca falou isso antes! Posto que teria sido impossível ter se falado de algo que ainda vai acontecer!

A – (IRÔNICO) O que você me diz sobre os adivinhadores do futuro?

B – Esses não valem!

C – Como não valem? Você tá querendo dizer o quê? Minha mãe lê cartas, por exemplo! De certa forma ela está falando de algo que ainda não aconteceu.

B – Sim, mas ela está inventando um futuro, que provavelmente será seguido e realizado por aqueles que fazem consulta a ela. Mas não é a isso que me refiro! Não quero falar do futuro... nem do passado. Vamos falar do agora. Do que está acontecendo AGORA!

D – Mas o que é que está acontecendo agora?

A – A gente está jogando conversa pro ar! Divagando sobre o nada!

B – Então é isso! Nosso tema é a conversa jogada pro ar!

C- Ok. Mas existe algo mais acontecendo, além dessa conversa jogada pro ar. (MISTERIOSO) Outras coisas estão acontecendo lá fora. Acontecendo neste exato momento, em que estamos aqui diante deste público.

A – O quê, por exemplo?

C – Tem pessoas... cruzando as faixas de pedestres neste exato momento.

TODOS ESTRANHAM!

B- Calma, aí! (TRATA O PERSONAGEM C COMO SE ELE ESTIVESSE DOENTE) Sente aqui nesta cadeira. Gente, traga um copo d´água pra ele, por favor.

C – Pessoal, é sério. O agora é muito mais rico do que a gente possa imaginar. Se o que nunca foi feito está acontecendo agora, então temos muito a dizer! (PERGUNTANDO-SE) Ou muito a fazer? Por exemplo, eu vi em um telejornal que um homem está morando numa faixa de pedestres.

SILÊNCIO.

B – (IRRITANDO-SE) Gente, dessa vez não traz água, não! Traga um whisky pra ele, por favor.

O PERSONAGEM C SAI DO CÍRCULO DE PEDESTRES.

C – Vocês não viram? Lá no Alaska? Da noite pro dia... de uma hora pra outra, a faixa de pedestres virou morada pra aquele Alaskiano.

A –(IRONIZANDO) Alaskiano? Você tem certeza que quem nasceu no Alaska é alaskiano?

C– Não me importa! O cara do Alaska está morando na faixa de pedestres.

D - Calma aí! Como assim de uma hora pra outra?

C – Foi assim: numa noite qualquer, o povo do Alaska foi dormir em suas casas... eles dormem muito cedo.. sei lá... deve ser ao frio. Quando eles acordaram pela manhã , deu-se o acontecido: Um homem estava morando na faixa de pedestres! Com tudo... sofá, televisão, geladeira... notebook !

A – (RINDO) Isso não pode ser! Ninguém pode criar moradia na faixa de pedestres. Lá não tem aquele documento que os prédios têm quando são construídos... como se chama? Ah... o habite-se. Você está louco!

SURGE DE REPENTE NA CENA O PERSONAGEM E.

E -(RESFOLEGANTE) Ele tem razão! Se vocês querem falar de algo que está acontecendo agora, é isso que acontece! Trata-se de um novo vírus. Ontem mesmo na Rua São Raimundo aqui em Salvador um rapaz bem-apessoado começou a morar na faixa de pedestres também. Igualzinho ao rapaz do Alaska! Toda a população baiana está em polvorosa. Ninguém fala em outra coisa!

B – Meu Deus! Não poderemos mais cruzar as ruas com os carros. Vamos passar por cima dos sofás... das geladeiras das pessoas! (DESESPERANDO) Por onde eu vou transitar com meu carro, meu Deus! (GRITANDO) Por onde?

A – (AGARRANDO E ACALMANDO PERSONAGEM B) Calma!

B – Calma , o quê? Se isso virar moda, eu não vou ter por onde transitar com meu Crossfox! Eu quero dirigir! Eu preciso dirigir!!! Eu preciso me locomover!!!

E- Se locomova a pé!
B-Como me locomover a pé?! Tá louco? Eu comprei aquele carro pra quê? Pra sair a pé por aí, porque existe um bando de malucos morando nas faixas de pedestres? É isso? (GRITANDO) É disso que vocês querem me convencer? É isso?! (SUBITAMENTE O PERSONAGEM A ESBOFETEIA PERSONAGEM B, NA TENTATIVA DE ACALMÁ-LO)
SILÊNCIO.

TODOS OLHAM O ATO EXAGERADO DO PERSONAGEM A. ESTE SOLTA O PERSONAGEM B, COMO SE ISSO FOSSE LIVRÁ-LO DA CULPA DE AGRESSÃO. PERSONAGEM B REGOZIJA-SE COM O TAPA, PERMANECENDO A MÃO AINDA SOBRE O ROSTO. PERSONAGENS COMEÇAM A DESFAZER O CIRCULO DE CONES, CRIANDO AGORA UMA CONFIGURAÇÃO DISFORME COM OS CONES.

D– (REFERINDO-SE AO PERSONAGEM B) Ele tem razão! Como faremos com nossos carros! Isso vai interromper o fluxo do trânsito. Isso vai interromper o fluxo da vida!

C – (SÚBITO) Depende! Isso depende da quantidade de faixas de pedestres que existem no mundo.

A – (GRITANDO) Pare, gente! Que loucura é essa? Vocês estão concordando com essa ideia maluca de morar numa faixa de pedestre. Habitar naquelas faixas brancas, tal e qual elas fossem uma casa?

B – (AINDA SOFRENDO COM A MÃO NO ROSTO) Mas uma coisa que eu não estou entendo. Por que esse cara está morando na faixa de pedestre, meu Deus! Por quê?

A – Não ponha Deus na conversa!

PAUSA.

B – (SÚBITO) A faixa de pedestre é um espaço perigoso! Morar ali é um perigo!!!

D – Passar por ela, independente de morada, já era um perigo! Mesmo no sinal verde!

C – Perigo por quê? Em tese se existe alguém ali na faixa, é porque o sinal está aberto pra ele! (DESCOBRINDO) Ah! Pode ser isso! Pode ter dado uma pane no sistema de semáforo, e agora o sinal está eternamente verde para os pedestres! Por isso eles devem ter feito morada por lá! É isso!

E – Não me parece isso. No vermelho ou no verde, eles estão sempre por lá. Estão morando lá... com cama e tudo mais. É virótico mesmo! As pessoas estão cada vez mais indo morar nas faixas de pedestres. O vírus começou lá no Alaska, e está se alastrando realmente para o mundo todo. Com o alto fluxo nos aeroportos não temos como evitar a epidemia. É um vírus... e ele está á fazendo com que as pessoas deixem seus lares, e se mudem de mula e cuia para as faixas de pedestres
A- Seria uma espécie de movimento político?
B- Movimento político?
A- Sim. Já aconteceu isso uma vez aqui em Salvador... por causa do gelo baiano.
B- (ESTRANHANDO) Gelo baiano?
A – Uma vez deixaram cair um gelo baiano enorme numa rua... bem na faixa de pedestres. E como todos nós sabemos, gelo baiano não derrete. Então na ocasião apareceu um rapaz com a desculpa de que o gelo baiano não derrete, disse que iria morar ali na faixa de pedestre. Será que não é a mesma coisa?

B – Como assim gelo baiano não derrete? Nem com fogo? Um maçarico? Duvido! Se for isso vamos derreter esse gele baiano, gente!

D – (PREOCUPADO) Não adianta! O gelo baiano é composto por uma fórmula química que impede seu derretimento.... não tem fogo ou maçarico que derreta o gelo baiano! Se a razão da moradia nas faixas de pedestres for isso, estamos lascados!

E – (TRISTE) Não foi o gelo baiano não, gente. Esses moradores de faixa de pedestres da Rua São Raimundo ou do Alaska foram afetadas pelo vírus que provocam o desejo insano de morarem na faixa de Pedestres. A razão exata somente no futuro os cientistas saberão explicar.

B – (AINDA COM A MÃO NO ROSTO. QUASE CHORANDO) Que vírus é esse, gente?

E – Teve um deles, que sentado no sofá, em plena faixa de pedestres, pediu a mão de uma garota em casamento. Ele já estava morando lá fazia um tempo. O trânsito todo parado. O trânsito não se movimentava dias. De repente... passou uma garota e ele confortavelmente deitado naquele sofá, clamou a mão da garota em casamento. (PAUSA) Ela aceitou o pedido de casamento. Deitaram-se então na cama de casal que estava ao lado, também na faixa de pedestre, e... (CONSTRANGIDO) começaram a transar insanamente na frente de todos que estavam presentes na rua. Senhoras de idade que estavam dias esperando a desobstrução da faixa para poder atravessar... crianças acompanhadas por seus pais... todos assistiam a transa louca e desvairada daquele casal.

B – (ESTUPEFACTO) Meu Deus!
E- Mas a transa foi interrompida por um outro cidadão afetado pelo vírus da faixa, que queria morar também naquela mesma faixa (IRRITADO) . Exatamente naquela faixa! Tantas faixas ao redor da cidade para o garoto, afetado pelo vírus, ir morar, mas ele queria aquela ali... ele queria a faixa de pedestres do casal. (ACALMA-SE, RESPIRA FUNDO E RETOMA CALAMAMENTE A NARRATIVA) Eles conversaram entre eles... entraram em um acordo. O garoto aceitou morar em um cantinho da faixa... um cantinho bem pequeno. Tão pequeno, que o garota não conseguia nem se deitar. Passou dias dormindo em pé, no pequeno pedaço de terra que resignadamente lhe coube. Anoiteceu, e o casal começou a escutar o silêncio ensurdecedor dos carros ligados e parados por vários por não poderem cruzar a faixa de pedestres. Uma pessoa chegou e questionou por que eles estavam ali deitados em uma cama no meio de uma faixa de pedestre. E avisou que eles não podiam estar por ali. Que era ilegal. O casal disse que aquela faixa era a casa deles... e a pessoa cobrou o documento de escritura da faixa de pedestres. Foi quando o homem disse que ele era um pedestre, a partir do momento em que a faixa de se chamava FAIXA DE PEDESTRES, logo essa a lhe pertencia, e não ao casal morador. Começou a explicar que a faixa tinha uma função específica que favorecia aos pedestres... que as faixas deveriam voltar a pertencer aos pedestres, e não aos moradores infectados por aquele vírus que viera do Alaska. Foi quando o menino que estava morando no pequeno pedaço da faixa começou a gritar que estava se sentindo muito sozinho... apesar de ouvir todas a noites o casal transando ao lado na cama tamanho king size. O pedestre-invasor se compadece com a queixa do garoto que mora na faixa de pedestres... e desiste de atravessar a faixa.. mesmo estando o sinal verde pra ele. O menino-morador então se questiona: como seria atravessar a faixa de pedestres? Na verdade ele não conseguia atravessar. Ele tentou uma vez... mas era um pedestre frustrado, que não conseguia realizar sua único função na vida que era atravessar faixas de pedestres. Um fracassado! Eu acho que ás vezes falta coragem aos pedestres. (TOM POLITIZADO) Coragem pra travessar aquela faixa.. .de maneira determinada... firme! Que nem os Beatles naquela famosa fotografia na Abbey Road!. Uma fotografia referência para todo pedestre destemido, e sabedor de sua função na vida: atravessar eufórica, corajosa e obsessivamente as faixas de pedestres! Sem medo do perigo. O garoto-morador contempla seu pequeno espaço de morada na faixa... ao luar. O casal dormia... dormia sem parar... na faixa de pedestres.
OS ATORES COMEÇAM A COLOCAR FAIXAS BRANCAS NO PALCO, FORMALIZANDO UMA FAIXA DE PEDESTRES.

D – Em outra faixa de pedestres... de um país não identificado, tem-se notícias de uma garota loira, que fica sempre agachada na sua faixa... morando! Movimenta-se engatinhando de lado a outro na faixa impedindo o fluxo contínuo dos carros. O silêncio também faz parte de sua existência.

O CLIMA AGORA É BASTANTE CALMO. VIOLINOS TOCAM AO FUNDO DA CENA.

ATORES AGORA COLOCAM UM SOFÁ.

A - Uma hora dessas, com esse vírus se espalhando por aí, já deve existir um morador em todas as faixas de pedestre do mundo. Nenhum carro mais consegue cruzar as ruas... ficando estáticos e engarrafados.

ATORES AJUSTAM UMA MESA DE CENTRO SOBRE A FAIXA DE PEDESTRE.
C- Faixas de pedestres... Pensando nesse lugar que é um espaço de travessia, imagino a faixa de pedestre também como um lugar de choque. Choque entre as pessoas. Um dos poucos lugares de encontro, onde a violência do toque é permitida. Você pode se esbarrar sem criticar. É um lugar de trânsito intenso. A violência é uma potência de relação e nas faixas de pedestres, muita violência acontece... seja de um carro levantando uma pessoa..... ou apenas um ombro encontrando outro ombro inadvertidamente.
C- Sempre que eu cruzava uma faixa de pedestre, eu me desviava das pessoas. A faixa é um caminho. Que às vezes é obstruído.

ATORES TRAZEM UMA GARRAFA DE CHAMPAGNE.
 B- Uma vez eu soube de um casal que dançou uma música... acho que uma bossa nova... no meio da faixa de pedestres. O trânsito obviamente parou... mas as pessoas não se incomodavam com aquele casal dançando... aquele momento estava parado e ao mesmo tempo ativo. A faixa era como se fosse um palco!
A – Uma vez eu vi a mesma coisa, mas o casal dançava um arrocha... aquela música onde o corpo desenha um oito.. sabe como é?

NESSE MOMENTO VEMOS UMA VERDADEIRA SALA DE VISITAS SOBRE A FAIXA DE PEDESTRES. ELES SE PERCEBEM MORADORES DESSE ESPAÇO.

E – Um dia, eles ainda vão descobrir uma vacina que nos liberte desse vício de morar aqui, nestas faixas de pedestres. Mas enquanto essa vacina não existe, o usucapião nos protege e nos legitima na nossa insistente morada sobre as faixas! Pois elas nos pertencem. Foi nela que nos encontramos. Que nos abordamos. Ela é e sempre será, nossa via de acesso. Abramos essa garrafa de champagne.

MÚSICA ESTRANHA DE NINA HAGEN INVADE O AMBIENTE. PERSONAGENS NO MEIO DAQUELA SALA DE VISITAS EM PLENA FAIXA DE PEDESTRES, BEBEM A CHAMPAGNE E DIVERTEM-SE AO SOM DA MÚSICA .

ENVELOPES LACRADOS COMEÇAM A CAIR DO ALTO, COMO QUE UMA CHUVA DE CARTAS. OS PERSONAGENS DIVERTEM-SE AINDA MAIS EM REGOZIJO COM A GRANDE QUANTIDADE DE CARTAS QUE CAEM DO CÉU, AO SOM DA MÚSICA QUE CONTINUA INCESSANTEMENTE. DE REPENTE A CHUVA DE CARTAS É INTERROMPIDA, APESAR DA CONTINUIDADE DA MÚSICA. ATÉ QUE EM DETERMINADO MOMENTO, O PERSONAGEM B, RESOLVE PEGAR UMA DAS CARTAS, ENQUANTO OS OUTROS PERSONAGENS DANÇAM. O PERSONAGEM B ABRE E COMEÇA A LER A CARTA EM VOZ ALTA. NO PRINCÍPIO SUA VOZ É INAUDÍVEL E SE CONFUNDE COM O SOM DA MÚSICA DE NINA HAGEN, MAS AOS POUCOS A MÚSICA VAI SE DISSIPANDO, E COMEÇA-SE A OUVIR SOMENTE A VOZ DO PERSONAGEN B QUE VAI ADQUIRINDO , ASSIM COMO OS OUTROS PERSONAGENS, UM SEMBLANTE MENOS DIVERTIDO E MAIS PREOCUPADO.

B -... e foi assim que ficou determinado que no exato lugar onde se sofre a passagem da vida ou o processo de mortificação... ali naquele ponto, o espírito faz morada. E se faz presente por toda eternidade como um sinal para aqueles que ficaram... (SOM DE NINA HAGEN VAI RETOMANDO O AMBIENTE, IMPEDINDO A PLATEIA DE OUVIR O RESTANTE DA CARTA LIDA PELO PERSONAGEM B NAQUELA SALA DE VISITAS EM PLENA FAIXA DE PEDESTRES, MAS OS PERSONAGENS CONTINUAM OUVINDO A LEITURA DA CARTA, COM SUAS TAÇAS DE CHAMPAGNE NAS MÃOS. O PERSONAGEM C CHORA. O PERSONAGEM A GARGALHA. O PERSONAGEM D SE SEPARA DO GRUPO COM AS MÃOS NOS OUVIDOS QUERENDO NÃO MAIS OUVIR O CONTEÚDO DA CARTA. O PERSONAGEM E SENTA-SE NO SOFÁ REFLEXIVO. SOM DE NINA HAGEN TORNA-SE ENSURDECEDOR. BLACK-OUT ACONTECE SIMULTANEAMENTE COM A INTERRUPÇÃO DA MÚSICA).

SILÊNCIO

DEPOIS DE ALGUNS SEGUNDOS A LUZ VOLTA. O PALCO ESTÁ VAZIO. APENAS A FAIXA DE PEDESTRES INSISTE NA CENA.

AO FUNDO PROJETA-SE A SEGUINTE FRASE COM FONTE SUFICIENTEMENTE GRANDE PARA QUE SEJA LIDA PELA PLATEIA:

"NO BRASIL, A CADA ANO MORREM EM MÉDIA 13.000 MIL PESSOAS NA FAIXA DE PEDESTRES"

A PROJEÇÃO SUSTENTA-SE POR ALGUNS SEGUNDOS, E DISSIPA-SE.

SILÊNCIO.
 FIM.

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